quinta-feira, 15 de julho de 2010

Visão do passado (poesia de Horácio Paiva)

Alguém com mais de cinquenta anos resolveu escrever sua história e o fez em versos como lemos abaixo

Pela estrada do destino percorrida
Em mais de meio século de vida
Toda envolvida num espesso véu
Fui como a poeira que ao sabor do vento
Ora rola no solo lamacento
Ora flutua pelo azul do céu

Em pensamento volto a essa estrada
Outra vez a fazer a caminhada
Para rever aquilo que passou
E em cada curva suave do caminho
Vou encontrando a luz desse carinho
Cuja saudade nunca se apagou

Aqui teias de aranha então deserta
E a voz de um velho mestre que dicerta
A todos ensinando, mas alí
Noutra curva mais densa e mais fechada
Ressoa a voz daquela molecada
Companheiros dos tempos de gurí

Velho la longe a rústica igrejinha
Onde um mestre já bem velhinho vinha
Falar-nos de Deus e Sua Lei
E ali desci às águas do batismo
Aprendi a sorrir em um catecismo
E onde feliz um dia me casei

Num velho tronco do caminho a beira
Eu encontro essa frase zombeteira
Que num dia de mágua eu quiz gravar
"Amor é ilusão que fere e mata,
Que empana a vista e o coração maltrata
Deixando cicatrizes a sangrar"

Nessa estrada que coisa interessante
Vejo as somnbras dos tempos de estudante
Recordando esse tempo tão feliz
Tempo em que a vida era uma gargalhada
E a tristeza não tinha em mim morada
Quantas asneiras então não fiz

Qual lâmpada votiva no ar suspensa
Um velho Ypê erguia a copa imensa
Como um tesouro todo aberto em flor
Era um trecho feliz da minha vida
Que minh´alma revia comovida
toda feita de luz, de sonhos de amor

E a árvore espalha as túrgidas raízes
Mostrando horas de amor, dias felizes
Toda galhos em flor, risonha até
Era um símbolo vivo que se erguia
Um grande livro aberto que se lia
"Minha esposa, meus filhos, minha fé.

Revejo as andorinhas pelo espaço
Buscando a casa velha, meu regaço
Ruflando as asas pela imensidão
Ouço vozes da minha mocidadee
Procurando no amor felicidade
Que nem se sabe se é verdade ou não

Então a relembrar fato por fato
Vi as águas de um trêmulo regato
A murmurar talvez uma canção
Talvez pranto que a terra alí vertia
E o marulhar das águas me trazia
Dos meus saudosos pais a evocação

Passo a passo revi o meu passado
Sem ter um dia ao menos reparado
Na ventura e na dor que suscitou
Nas vozes que ouvi muito baixinho
Nos rastros que deixei no meu caminho
Nas saudades imensas que deixou

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